quarta-feira, 30 de abril de 2008

Os desafios do FDA

A mais importante revista médica do mundo, a New England Journal of Medicine (NEJM), publicou um importante editorial sobre o FDA ( Food and Drug Administration), que é o órgão responsável, entre outras atribuições, pela aprovação, fiscalização e regulamentação de medicações nos EUA.

O FDA era considerado, até bem recentemente, um instituto extremamente confiável. Era comum em congressos médicos, quando se discutia sobre a eficácia ou segurança de uma nova droga, um dos debatedores, para fechar a questão, dizia de boca cheia: “Essa medicação foi aprovada pelo ÉFI-DI-EI!”. E o assunto estava encerrado.

Mas isso tem mudado ultimamente com a divulgação pela imprensa do desleixo com que a agência tem sido dirigida, do peso dos lobbies para a autorização de novas drogas e da falta fiscalização e regulamentação das medicações. Hoje, os bons médicos já não se fiam mais no FDA e sim em estudos científicos bem realizados (leia bem: os BONS médicos). Eles desconfiam da agência americana desde o famoso caso do VIOXX, que foi aprovado pelo FDA e era vendido com o argumento de que tinha menos efeitos colaterais que os antiinflamatórios convencionais, mas que posteriormente se descobriu, que apesar de diminuir a chance do desenvolvimento de úlceras ou gastrites, essa medicação aumentava o risco de ataques cardíacos e derrames cerebrais. Que beleza, né? A pessoa se livrava de uma queimação e ganhava um infartozinho! Após a morte de alguns pacientes em decorrência do uso dessa droga, ela foi proibida pelo FDA.

Segundo o editorial do NEJM, o FDA tem grandes desafios pela frente para tentar reaver sua credibilidade. A começar pela nova determinação da Suprema Corte americana, que definiu que a aprovação de uma medicação pelo FDA impede um processo judicial de uma pessoa que se sinta prejudicada pelo uso de uma medicação contra o laboratório fabricante. Mas sabendo que o FDA tem diminuído seu quadro de pessoal, apesar do aumento de demanda e do aumento da sua responsabilidade, do histórico de erros e do poder que os lobbies têm de influenciar a agência isso se torna no mínimo temerário para a população americana.

Outro grande desafio, segundo a revista, é o controle de qualidade das medicações e matérias-primas importadas. É famoso o caso das mortes causadas pela heparina produzida pela multinacional Baxter com ingrediente chineses contaminados. Esse caso teoricamente deveria ter sido prevenido pelo FDA, mas é compreensível que não tenha sido. Veja esse quadro:



Esse quadro mostra os 10 países que mais foram inspecionados pelo FDA de 2002 a 2007. A barra azul mostra o número de estabelecimentos que produzem medicações ou matérias-primas importadas pelos EUA e a amarela, as que foram inspecionadas. É fácil perceber que o FDA não está a altura desse desafio. Logo, a Suprema Corte americana está dando um poder e uma responsabilidade a essa agência que ela não tem condições de arcar.

Voltarei a esse assunto num post futuro.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

2 links

Vale a pena ler o post do Idelber e o debate nos comentários (a minha opinião está lá) sobre a proibição da aliança PT-PSDB-PSB em BH pela direção nacional do PT, para a eleição municipal desse ano. O debate está quente e estimulante. Confira lá, eu garanto!

Outro texto interessantíssimo sobre um tema atualíssimo é o do Rafael Galvão sobre a morte da menina Isabella e a do padre voador. Ele analisa a aberração que é esse "carnaval" que está sendo feito, pela mídia e pela "turba do pega e lincha", acerca da morte da garotinha e compara com as reações suscitadas pela morte do padre. ( Peguei essa dica no blog LLL, do Alex Castro)

domingo, 27 de abril de 2008

Quando as aparência não enganam



" As aparência enganam" é um ditado popular quase sempre válido. Mas veja essa foto acima do general Augusto Pinochet. Ela engana você?

quinta-feira, 24 de abril de 2008

3 dicas: 2 artigos e uma entrevista

A primeira dica é o artigo do Contardo Calligaris publicado hoje na Folha De S. Paulo. Ele se chama " A turba do "pega e lincha"". Nele o psicanalista analisa o comportamento da multidão enlouquecida que faz figuração a cada flash ao vivo das TVs que cobrem o caso da menina Isabella Nardoni.

A certa altura ele diz : "Eles realizam uma cena da qual eles supõem que seja o que nós, em casa, estamos querendo ver. Parecem se sentir investidos na função de carpideiras oficiais: quando a gente olha, eles devem dar evasão às emoções (raiva, desespero, ódio) que nós, mais comedidos, nas salas e nos botecos do país, reprimiríamos comportadamente". Depois acrescenta: "Eles realizam uma cena da qual eles supõem que seja o que nós, em casa, estamos querendo ver. Parecem se sentir investidos na função de carpideiras oficiais: quando a gente olha, eles devem dar evasão às emoções (raiva, desespero, ódio) que nós, mais comedidos, nas salas e nos botecos do país, reprimiríamos comportadamente". E conclui fulminantemente: "A turba do "pega e lincha" representa, sim, alguma coisa que está em todos nós, mas que não é um anseio de justiça. A própria necessidade enlouquecida de se diferenciar dos assassinos presumidos aponta essa turma como representante legítima da brutalidade com a qual, apesar de estatutos e leis, as crianças podem ser e continuam sendo vítimas dos adultos".

Não preciso nem acrescentar, que nesse caso, a mídia alimenta a turba e a recíproca é verdadeira.

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A segunda dica é outro artigo de hoje do mesmo jornal. Trata-se da coluna do bom e velho Janio de Freitas. Nela ele fala sobre os perigos, para nossa democracia incipiente , de uma crise militar que a turba do PSDB-DEM vêm tentando criar a partir das declarações do general Augusto Heleno Pereira acerca da demarcação da reserva indígena Raposa/ Serra do Sol.

Ele diz que isso é " um ato irresponsável de desespero pelo aturdimento, decorrente da própria incapacidade de encontrar políticas inteligentes de oposição e, como conseqüência, perspectivas promissoras para os seus partidos".

O artigo lembra também que a corrente das Forças Armadas que investe contra a política indigenista do governo é a mesma da linha-dura do Regime militar, que agora volta aos poucos à atividade política.

Soma-se à irresponsabilidade tucano-pefelê a hipocrisia, já que essa demarcação foi feita no governo FHC. Haja estômago!

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A terceira é a bela entrevista com o mestre Mino Carta publicada na Revista do Brasil . Como era de se esperar não faltou polêmicas e caneladas. Grande Mino!

domingo, 20 de abril de 2008

Reflexões sobre a questão racial no Brasil

O LLL escreveu uma interessante série de posts sobre a questão da raça e do racismo no Brasil, que rendeu uma discussão mais passional do que deveria; e instou-nos a comentar sobre ela.

A discussão começou quando um amigo dele americano disse que o uso da palavra “nego”, como na frase: “ Nego não acredita mas eu raramente leio blogs”, pode ser considerado ofensivo, racismo. O que ele, e confesso que eu também, discordava inicialmente. Para ele, e para mim, essa palavra era um tratamento comum, sem sentido racial. Mas quanto peso pode ter uma palavra!

O certo é que no Brasil nós temos horror à questão racial. Nós chegamos até ao extremo de negar que ela exista. Nada pode abalar a nossa utopia da “democracia racial.”

A questão racial no Brasil guarda uma diferença fundamental em relação aos EUA, conforme diz esse trecho do importante livro “A utopia brasileira e os movimentos negros”, do Antonio Risério : “ A fusão mestiça brasileira do padê ( expressão de origem ioruba que significa o ato do encontro) é uma coisa; o zelo puritano do aparthaid , outra”. Mas é aí que mora o perigo...

É comum se confundir nossa mestiçagem e tolerância com “democracia racial”. Nada mais enganoso. O racismo no Brasil existe, mas de uma forma mais sutil e não menos opressiva. Ele existe nas entrelinhas.

Veja alguns argumentos de quem defende que não existe racismo no Brasil:

1) “Eu tenho um amigo negro que eu chamo de Negão, mas é com o maior carinho e ele nem liga”. Eu não teria tanta certeza de que ele não liga... Na minha sala , na faculdade de medicina, tinha apenas um negro e o apelido dele era Robinho. Ele passava , alguém dava um tapa na cabeça dele e gritava “pedala, Robinho”; e todos caiam na gargalha, até ele sorria. Um dia ele me confidenciou que achava que era vítima de racismo e se sentia humilhado com isso. Mas como humilhado? É uma brincadeira, até ele ria dela? Por isso, só eles, os Robinhos, os Pelés, os Negões, podem dizer se eles ligam ou não para isso.

2) “Os negros têm mais preconceito que os brancos”. Bom, esse argumento eu não sei de onde saiu. Mas mesmo se fosse verdade, mesmo se os negros tivessem mais preconceito que os brancos, isso seria justificável por razões históricas óbvias...

Eu poderia listar mais dez ou vinte argumentos e rebatê-los um por um. Mas não quero cansá-los...

O que eu concluí depois de ler os posts do LLL, os comentários e o livro do Risério ( que foi uma leitura recente) é que o desejo da “ democracia racial” é tão grande em nós brasileiros que estamos dispostos a impô-la. É como se disséssemos: “ Oh Pelézinho, fica de boa aí. Eu te chamo assim, mas é carinhosamente, sem preconceito. Se tiver achando ruim pode me chamar de “Branquelo” e fica elas por elas”.



Vale a pena ler todos os posts da série. Leia aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Woody Allen, literatura e preconceito

Sempre fui um fã do cineasta Woddy Allen. Quando me pedem uma lista dos 1o maiores filmes de todos os tempos, eu sempre incluo " Annie Hall" ou "Zelig". Pois bem.

Sempre que eu ia pegar um livro na minha estante, eu me deparava com 2 livros de contos dele. Eu tinha vontade de lê-los, mas nunca o fazia , pois pensava: " Pior que um escritor bancando o cineasta, é um cineasta bancando o escritor". Era puro preconceito.

Depois eu decobri, que antes dele ser um cultuado diretor, ele era um colaborador assíduo de uma das mais prestigiosas revistas do mundo, a " New Yorker", desde os anos 60. Então resolvi ler os livros.

E que surpresa agradável. Ele é um escritor interessantíssimo. Enxerga-se nos seus contos aqueles mesmos personagens neuróticos dos seus filmes. É ler e dar muita risada.

A sua ironia, velha conhecida dos cinéfilos, está presente em doses cavalares nos seus livros. Como por exemplo nesse trecho: " Minha mulher era rigorosamente infantil. Um dia eu estava tomando banho na banheira e ela afundou todos os meus barquinhos sem o menor motivo"; e nesse:" É impossível encarar a própria morte objetivamente e assoviar ao mesmo tempo"; e nesse também: " O rito de iniciação na Máfia é bastante complicado. O membro a ser admitido é levado a um quarto escuro com os olhos vendados. Fatias de melão são colocadas em seus bolsos e ele é obrigado a pular pelo quarto num pé só, gritando " Ula-lá! Ula-lá!". Em seguida , todos os membros da comissione fazem bilubilu no seu lábio inferior- alguns até duas vezes. O suplício seguinte é derramar aveia na cabeça do iniciante. Se ele protestar, será executado. Mas, se disser, "Que bom! Adoro aveia!", será recebido como um irmão. Então todos o beijarão na face e apertarão sua mão. A partir daí, terá de obedecer as seguintes obrigações: não comer jiló, não cacarejar e não matar ninguém chamado Vito."

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Por falar em Woody Allen, faz tempo que não vou ao cinema. Deve fazer umas 2 semanas. Para quem vai normalmente 2 vezes por semana, isso é um tempão.

Nesse fim de semana eu vou ver pelo menos o " The Rolling Stones- Shine a light" . Não tem como dar errado : Scorcese + Rolling Stones...