domingo, 25 de janeiro de 2009

O levante dos malês

Há exatamente 174 anos centenas de negros- a maioria escravos-, vestindo abadás e barretes, investiram contra as espingardas das forças do Estado, empunhando porretes e espadas, e instalaram o caos nas ruas de Salvador. Era o levante dos malês, a mais fascinante revolta escrava ocorrida no Brasil.

Sob a batuta dos mestres Ahuna, Pacífico Licutan, Manoel Calafate, Dandará, Luís Sanin e outros, um grupo de africanos islamizados (a maioria dos revoltosos), os malês, que foram capturados na sua terra e escravizados no Brasil, planejaram o levante por anos. Reuniram-se, confabularam, juntaram dinheiro (para comprar as cartas de alforria dos mestres que ainda não eram libertos), adquiriram armas...Queriam, quem sabe, implantar o Califado da Bahia, além de matar todos os brancos e escravizar os mulatos.

A explosão da revolta estava marcada para o dia 25 de janeiro de 1835, pela manhã, dia de Nossa Senhora da Guia, dia em que a vigilância aos cativos provavelmente estaria mais relaxada. Mas o plano inicial teve que ser alterado, e isso pôs tudo a perder.

Na madrugada do dia 24 para o dia 25 de janeiro, um grupo de malês estava reunido na casa de Manoel Calafate, esperando o amanhecer do dia para começar o ataque. No entanto, por mais que tivessem tomado cuidado, boatos de que escravos estariam programando uma grande rebelião começaram a circular por Salvador. Agentes do Estado já começaram a ficar de orelha em pé. Aí, uma atitude passional serviu para alertar os policiais. A liberta Sabina, após trocar informações com outra liberta, a Guilhermina, resolveu ir à casa de Manoel Calafate, procurando seu companheiro, Victório Sule, com quem tinha brigado naquele dia pela manhã e que saíra de casa levando uma trouxa de roupas. Ela sabia que ele era um dos conspiradores. Ao chegar à casa do mestre e ouvir que Victório não estava lá, ela aprontou um escândalo, dizendo que ouvira a voz do companheiro e que a deixassem entrar, senão... Bom, diante disso, os policiais tiveram que agir. Quatro foram enviados para a casa de Calafate. Os malês que lá estavam reunidos, vendo que não poderiam mais esconder a conspiração, resolveram adiantá-la. Mataram os quatro policiais e sairam às ruas, desordenadamente, avançando sobre as fortificações e a cadeia - para libertar o mestre Licutan, que lá estava preso.

Por 3 horas o caos foi total nas ruas de Salvador. Mas eram porretes, facas e espadas contra espingardas e pistolas; além disso, os malês não puderam fazer o ataque como planejaram, pois outros grupos, reunidos em outras casas, esperavam o dia amanhecer para poder entrar em ação. Com isso, os malês, apesar de terem lutado bravamente, foram presas fáceis para os policiais. Muitos foram mortos, outros, presos. Os mestres que escaparam, sumiram e o islamismo foi perseguido ferozmente nos anos seguintes. O sonho do califado da Bahia foi definitivamente enterrado.

Essa é a história, bem resumida, do impressionante levante dos malês.

Fonte: REIS, João José. Revolução escrava no Brasil: a história do levante dos malês em 1835. Companhia das Letras.

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